BOLETIM DO FORUM NACIONAL DE REFORMA URBANA

 

Rio, 24 de abril de 2009. Ano 5 nº 62 .

A Reforma Urbana e o Programa Minha Casa Minha Vida

Com o lançamento pelo Governo Federal do Programa Minha Casa Minha Vida, visando a construção de 1 milhão de novas moradias, o FNRU vem refletir sobre o conjunto de medidas anunciadas, na perspectiva da promoção da reforma urbana e do direito à cidade.

O programa pode ser considerado um avanço, quando observados o volume de investimentos do governo federal que são aportados para a construção de moradias e o impacto positivo que pode gerar na dinâmica econômica, respondendo à crise e combatendo o desemprego. No Entanto, o conjunto de medidas anunciadas ainda está longe de atender à demanda real da população de baixa renda e dos sem-teto excluídos não só do direito à moradia digna, mas também do direito à cidade.

Da proposta de construção de 1 milhão de moradias, apenas 400 mil (40% do total de moradias) estão destinadas a atender às famílias que ganham até 3 salários mínimos. Contudo, são estas famílias responsáveis por mais de 90% do déficit habitacional brasileiro.

O Programa não prioriza a construção de uma política habitacional, tal qual foi concebida na lei que criou o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social, primeira lei de iniciativa popular finalmente aprovada em 2005. Ao invés disso, dá continuidade a uma prática que tem sido a tradição da política brasileira quando se fala em habitação: centrar na oferta de subsídios e créditos individualizados para a obtenção da propriedade privada, bem como na construção de unidades habitacionais também individualizadas, sem que as necessidades habitacionais da população de baixa renda sejam efetivamente atendidas.

O resultado desta tradicional prática pode ser observado nas cidades brasileiras: a construção de bairros populares periféricos e segregados da cidade, que contribuem para a continuidade da exclusão social que atinge considerável parcela da população brasileira e para o aumento da violência urbana.

O FNRU reafirma que, para atender as necessidades habitacionais da população de baixa renda e de sem-tetos é preciso um conjunto de medidas que articule:

o aproveitamento dos imóveis públicos vazios e subutilizados, em áreas centrais, já urbanizadas e infra-estruturadas e com ampla disponibilização de equipamentos comunitários;

a aplicação da concessão de uso especial para fins de moradia;

maior incentivo às cooperativas, associações e movimento sociais para a produção social da moradia e não somente, e exclusivamente, à produção empresarial dominada por grandes construtoras;

a garantia da qualidade da moradia, respeitando padrões dignos de habitabilidade;

a adoção de novos regimes de propriedade imobiliária;

– o aperfeiçoamento das modalidades de financiamento e adoção de novas modalidades de oferta de serviços habitacionais, como o aluguel subsidiado e a locação social;

– a assistência técnica articulada com recursos para a promoção habitacional por autogestão ou para a compra de materiais de construção, entre outros.

a implementação da política de regulação do uso do solo e dos instrumentos previstos no Estatuto da Cidade e nos planos diretores, de forma a coibir a especulação imobiliária e pressionar pela ocupação dos vazios urbanos.

O FNRU reafirma que, para isto, é fundamental a implementação do Sistema de Habitação de Interesse Social, com todos os seus componentes, nas 3 esferas da federação: a POLÍTICA e o PLANO DE HABITAÇÃO, o órgão gestor da política, o FUNDO, que garanta os recursos, e o CONSELHO, gestor da política e do Fundo, com participação dos segmentos populares que representam as famílias onde está concentrado o déficit habitacional. A implementação do SNHIS no plano nacional e nos estados e municípios deve ser monitorada e avaliada continuamente, de forma a permitir um processo permanente de atualização dos instrumentos e de sua operacionalização.

Assim, considerando as preocupações aqui assinaladas, e considerando, também, que tramita na Câmara dos Deputados a Medida Provisória 459 que cria o Programa Minha Casa Minha Vida e dispõe sobre a regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas, o FNRU vem se manifestar sobre algumas questões que considera estratégicas na MP em debate.

O FNRU E A MP 459

Visando a efetivação do programa na perspectiva do direito à cidade, o FNRU considera que é fundamental incorporar na MP 459 três aspectos principais:

1. A AMPLIAÇÃO DAS AÇÕES QUE INTEGRAM O PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA E SUA LOCALIZAÇÃO PRIORITÁRIA EM ÁREAS CENTRAIS INFRAESTRUTURADAS

1.1. O FNRU entende que, além da produção de unidades habitacionais novas, é fundamental que sejam incorporadas ao PNHU outras modalidades que já se encontram em funcionamento e que não apenas viabilizam o acesso a moradia para os setores de menor renda como também contribuem para promover a reabilitação de áreas vazias e subutilizadas, além de, também  gerar empregos, como:  a locação social, a requalificação de imóveis, a produção de lotes urbanizados, entre outros. (emenda 35 do deputado Zezéu Ribeiro).

1.2. Além disso, o FNRU considera que é fundamental assegurar que o repasse de recursos federais para as construtoras seja feito exclusivamente para aqueles municípios que tenham plano diretores atualizado nos termos do Estatuto da Cidade (parte da emenda 289 do deputado Eunício de Oliveira, subscrita por outros ),de forma a ampliar as possibilidades de articular os programas e políticas habitacionais com as políticas de regulação do uso do solo, gerando melhor inserção urbana dos conjuntos produzidos .

1.3. O FNRU entende, ainda, que a alocação de recursos deve priorizar as áreas centrais e infra-estruturadas dos centros urbanos, com parâmetros diferenciados de financiamento nestes casos, de modo que os setores privado e público priorizem a implantação de moradias em locais com serviços de saúde, educação, transporte, empregos e oportunidades de desenvolvimento humano, revertendo a tendência atual de concentrar os empreendimentos de moradia popular em áreas distantes e sem infra-estrutura urbana e social e provocando o aumento da segregação e da violência urbana. Neste sentido, o FNRU apóia a emenda 87 do deputado Zezéu Ribeiro que cria um novo artigo que estabelece critérios para distribuição de recursos no âmbito do PNHU: consideração do déficit habitacional e priorização dos municípios que doem terrenos vazios em área urbana consolidada, que implementem os instrumentos do Estatuto da Cidade voltados ao controle da especulação imobiliária e medidas de desoneração tributária para construções habitacionais de interesse social.

2. A PARTICIPAÇÃO E O CONTROLE SOCIAL SOBRE O PROGRAMA

2.1. O controle social deve estar presente em todas as fases da implantação das medidas, tanto no nivel federal como no nivel local, de modo a buscar evitar o desperdício, o desvio ou a apropriação indevida dos recursos do programa . Desta forma, o FNRU apóia as emendas parlamentares que estabelecem mecanismos de participação e controle social, através de estrtuturas de gestão já existentes e que tem esta finalidade

– A emenda 81 do senador Inácio Arruda, com um acréscimo: a emenda prevê o acompanhamento e avaliação do PNHU pelo Conselho das Cidades. O FNRU propõe que dois representantes do Conselho das Cidades   integrem o o Comitê de Acompanhamento do PMCMV

– a emenda 101 do senador Inácio Arruda que prevê que prestação de contas anual do Fundo Garantido da Habitação ao Conselho das Cidades:

– a emenda 79 do deputado Paulo Ruben que prevê que o Conselho das Cidades deverá ser ouvido na regulamentação e gestão do PNHU;

– a emenda 103 do deputado Paulo Rubem, que propõe a alteração da redação do § 1º para prever a participação do Conselho das Cidades no comitê responsável pelo FGHab.

– a emenda 87 do deputado Zezéu Ribeiro que prevê que órgãos colegiados com participação dos segmentos da sociedade civil no plano municipal deverão ser ouvidos no processo de seleção dos empreendimentos.

3. A REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DE INTERESSE SOCIAL

3.1. A regularização fundiária de interesse social é um dos aspectos da MP 459. É papel do Estado promover o acesso a terra urbanizada para as populações de baixa renda, fomentando programas e processos de regularização fundiária, especialmente aqueles em áreas já reconhecidas como ZEIS pelos Planos Diretores Municipais, viabilizando acesso de recursos destas populações para melhoria e adequação de infra-estrutura, melhoria habitacional e regularização jurídica dos assentamentos. Assim, o FNRU apóia o conjunto de medidas  enumerados pela MP com relação à regularização de interesse social.

3.2. O FNRU compartilha a proposta de emenda 160 do deputado Zezéu Ribeiro de supressão dos artigos sobre regularização fundiária de interesse específico, entendendo que as novas regras devem abranger somente a regularização de interesse social.

3.3. O FNRU apóia emenda 189 do deputado Zezéu Ribeiro que prevê a possibilidade de regularização fundiária por etapas e explicita que eventuais problemas que retardem a regularização dominial não constituam empecilho para a regularização urbanística.

3.4. O FNRU se manifesta expressamente contrário às emendas 161 do deputado Gim Argello e 166 do deputado Tadeu Filipelli de alteração da redação dos conceitos de ZEIS e de regularização fundiária de interesse social (incisos V e VII), para beneficiar famílias de classe média, além da baixa renda, entendendo que a mudança proposta poderá desvirtuar o instituto previsto no no Estatuto das Cidades, destinado à regularização e produção habitacional de interesse social.

3.5 Desaprova, também, a emenda 176 do deputado Sarney Filho que estabelece a exigência de legislação ambiental para a aprovação do projeto e posterior  regularização que, na prática, inviabiliza a regularização fundiária.

3.6 O FNRU expressa também um posicionamento contrário à emenda 194 do deputado Zezéu Ribeiro, que exige o licenciamento urbanístico e ambiental, estabelecendo que este  seja feito de forma integrada apenas nos municípios com gestão plena,por considerar que este  será um grande obstáculo para viabilizar a regularização fundiária no país

O FNRU espera que a MP 459 incorpore as emendas estratégicas aqui assinaladas de forma a contribuir para que o programa se aproxime um pouco mais dos excluídos dos direitos à moradia digna e à cidade.

Pelo Direito à Moradia Digna!

Pela Reforma Urbana!

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